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Womenage a Trois

Women's True Banal Stories - womenageatrois@gmail.com

Junho 02, 2007

FuckItAll

Eu deitei a mão por mero acidente aos 120 Dias de Sodoma, quando tinha 11 ou 12 anos. Vou dar de barato que estaremos todos de acordo que esta obra de Sade em particular é um expoente da violência e do extremismo sexual, interligados com uma moral política e com uma linguagem estética, literária, muito particulares.

Se foi uma surpresa, um choque, e uma quantidade de novas questões para pensar? Sim. Se foi mesmo um acontecimento marcante? Sim, sim. Um grupinho de miúdos, entre o pré-púbere e o recém-adolescente (sim, a fase etária alvo do tal famoso filme, mais uns quantos mais velhos) juntava-se lá em casa em longas e preguiçosas tardes de verão para ler aquilo em voz alta, entre risinhos parvos, o que quer dizer que nos divertimos e não nos sentimos assim tão agredidos - embora nos tivessemos sentido questionados e aquilo desse para alguns debates. Neles, mas antes de tudo no muito tempo que dediquei a ler e digerir aquilo sozinha, aprendi imenso. Aprendi imenso sobre sexo, prazer e a infinita plasticidade deles. Sobre a infinita plasticidade da violência e do poder. Aprendi muito até politicamente. Aprendi que se pode perder o medo de dizer as coisas nuamente, que se pode perder o respeitinho à tão útil ficção social, que se pode usar o monstruoso como poética e retórica política, que o sexo pode ser uma experiência fascinante de libertação da norma e de subversão do valor. Aprendi, diga-se, com um radicalíssimo liberal, com um anarco-fascista. Bons mestres, não é? Bom. O que não aconteceu - e só vos posso dar a minha palavra a este respeito, lamento, there is no way i'm gonna discuss this any further - foi aquela leitura, que demorou anos a estar concluída, provocar-me qualquer trauma. Ou tornar-me menos inocente e desastrada do que qualquer outro adolescente. Não suscitou nenhuma adesão desmiolada, nenhuma confusão (ou desejo de confusão) entre ficção e realidade. Não provocou também uma rejeição, porque fiquei fascinada com a inegável beleza e razão própria da violência moral e intelectual daquilo tudo. Passou apenas a integrar as minhas referências.

Que fique claro, não estou com isto a defender que se promova a leitura de Sade pelas criancinhas (scenes we'd like to see...). Queria apenas tirar daqui , como moral da história, que o contacto com conteúdos sexuais explícitos, mesmo numa das expressões mais violentas e desadequadas a miúdos de que consigo lembrar-me, não provoca necessariamente nenhuma catástrofe. Que a inocência não morre da informação, morre dos medos e preconceitos, de ocultações e proibições. E que me parece boa atitude oferecer a um filho direcção, informação, apoio, conversa, tudo isso até um ponto razoável- mas também convém obrigarmo-nos a um respeito progressivo pelo espaço de desenvolvimento pessoal, para a procura e descoberta, e ainda para os acasos da vida, para a sucessão de acidentes e incidentes que são a história de vida de cada um de nós, e que acabam por ir também fazendo parte das pessoas que somos.

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