Fevereiro 03, 2016
Cenas Obscenas
...republico aqui um post meu de 2008, a propósito do proclamado "melhor escritor nacional":
Esta já vai atrasada. Mas antes tarde que nunca. Li, na Sábado de há duas semanas (nº 201), a entrevista/reportagem sobre José Rodrigues dos Santos. Fiquei devidamente informado sobre o dia-a-dia do cavalheiro. E a lição que nos dá a todos: "sou o escritor que mais vende em Portugal. Nos últimos quatro anos, já vendi acima de meio milhão de livros".
Estou longe de pensar que o sucesso deva ser motivo de modéstia, E muito menos de falsa modéstia. Mas mantenho a minha reserva: vender muito não significa ser-se um bom escritor. O síndrome Margarida Rebelo Pinto não me sai da cabeça. Enfim, adiante. Penso, porém, que quem vende tanto livro bem que poderia ser mais comedido a confessar certas coisas, porque não é sinal de coragem, mas sim de irresponsabilidade.
José Rodrigues dos Santos não recicla o seu lixo. Ou o come ao pequeno-almoço, ou simplesmente não está para isso. "Na parte que lhe cabe, poupa água. Mas pouco mais. Reciclagem? Pois, isso não. Nem vidro, nem plástico, nem papel? Nada? «Não, não faço. Sou uma pessoa normal». Muitas pessoas normais reciclam. «A média do cidadão não recicla o lixo. É muito complicado. Um saco é azul, outro é não sei o quê, aquilo é uma confusão»" (pág. 97).
Lembrei-me logo dos tempos em que célebres cromos milionários vangloriavam-se de declarar o ordenado mínimo no IRS. Hoje piam todos mais fino porque o fisco não dá tréguas. Chegará um dia em que a poluição será encarada a sério e estes meninos preguiçosos, balofos e irresponsáveis terão vergonha de dizer chalaças destas e começarão a fazer o que espero se torne "normal" rapidamente. Se for preciso meter o fisco, a ASAE ou a imprensa ao barulho, que se meta. Até lá, alguém deveria ensinar a estes filhos da abundância, da irresponsabilidade e do desperdício o que é um vidrão, um embalão, um papelão, um oleão, um electrão. Verde, amarelo, azul, laranja, vermelho. Tudo com cores diferentes para evitar raciocínios complicados que, já se sabe, estes intelectuais têm os neurónios ocupados nas tramas dos romances que escrevem. E se alguém um dia lhe encher a casa com o lixo que ele próprio produz e o afogar no entulho de que não cuida, no desperdício que não separa e cujo destino não quer saber, ninguém levará a mal por isso.