Ou, pior, com fedor a 24 Horas. Paciência. Fiquei com umas vontadezinhas de desabafar à conta da notícia do dia (ou destes dias, passado que está o Natal e enquanto não vem o Ano Novo): a morte da menina de 2 anos em Monção. Já vai sendo rotina. Crianças vítimas de "acidentes", que morrem mesmo que tenha havido denúncias, polícia, Segurança Social e Comissão de Protecção de Menores ao barulho. Uma vez mais, o ministro vem exigir o apuramento rigoroso das responsabilidades. A autópsia (inconclusiva) foi ontem, hoje está tudo com os olhos postos no caso e na mãe, que vai ser ouvida novamente. Querem um prognóstico para 2007? Vai ser provada a causa da morte por maus-tratos, os pais vão ser julgados (e enxovalhados pelo "povo" ao entrar e sair do tribunal, exigindo "justiça!") e, provavelmente, condenados com pena leve; as responsabilidades nunca vão ser apuradas, uma vez que a "culpa" vai saltitar entre competências mal-definidas, técnicos(as) mal apetrechadas, legislação possivelmente inadequada e confusa, sistema judicial lento, etc. E todos nós, ao brindar a Meia-Noite, esqueceremos que outras Saras morrerão em 2007.
Fiquei verdadeiramente impressionado com os breves segundos que vi na televisão ontem. Uma mãe que, menos de 24 horas após a morte da filha, diz para a câmara, com a maior calma, que "nunca bati na minha menina", como se estivesse a falar da novela ou do tempo. E um pai que faz um "ar-de-não-é-nada-comigo", diz que "se batesse nos filhos era em todos, não era só na mais nova" e diz, encolhendo os ombros, que ficou admirado quando a mulher lhe telefonou a dizer que a filha estava no hospital. Para mim, estes 30 segundos dizem tudo. Independentemente de estarem a mentir ou não. Se estão, são umas bestas assassinas. Se não estão, são uns monstros de frieza. Ou uma mistura de ambos.
A Sara morreu com 2 anos. A educadora contou, emocionada, como andava sempre infeliz, com frio, mal vestida, com sinais de maus tratos e com fome. Quando chegava ao jardim de infância, retribuía os sorrisos que lhe davam com pedidos de "pão". Sabem que mais? Eu digo que mais: teria sido um aborto abençoado. E os senhores do "Não" que me tentem convencer do contrário.