Outubro 22, 2009
Mouro da Linha
"Não concordo com nada do que você diz, mas lutarei até à morte pelo seu direito a dizê-lo" (Atribuído a Voltaire, mas certamente, e como quase sempre acontece nestas citações, apócrifo).
Já não há pachorra para ouvir dizer que "Saramago tem todo o direito de dizer o que quiser." Bolas, já toda a gente ouviu isso, e toda a gente sabe isso.
Vamos lá a ver: quando eu digo que o sr. Saramago, ou quem quer que seja, diz imensos disparates, não estou a negar o seu direito a dizê-los. Estou apenas a fazer uso desse mesmo direito - o direito de dizer que o sr. Saramago, ou quem quer que seja, diz imensos disparates. É o meu direito de opinião, é a minha liberdade de expressão. Manifestar o desejo de que Saramago se cale não é o mesmo que manifestar o desejo de que Saramago seja calado. Pedir a alguém que se cale não é o mesmo que calá-lo. Eu tenho o direito de pedir a alguém que não diga disparates. Não tenho o direito de pedir que esse alguém seja impedido de dizer disparates. É uma pequena diferença que faz toda a diferença. Mas que é geralmente ignorada nos debates deste género, em que se faz uso e abuso desse irritante artifício dialético de confundir a contestação dos disparates com a negação do direito a dizê-los - acabando assim por negar o direito de expressão a quem os contesta.
É um jogo de espelhos que tem sido muito evidente nos últimos dias, com toda a gente a acusar o outro de "reflexos persecutórios", "tendências inquisitoriais" e coisas do género. Toda a gente adora fazer-se de vítima. Mas toda a gente acaba por ceder ao impulso do carrasco.
(Agora vão aqui ver isto e o resto, que também está muito giro)