Março 26, 2008
Mouro da Linha
Fiz uma coisa que não fazia há séculos: comprei um relógio. Não é o da foto. Mas é grande, com francos ponteiros luminosos e honestos algarismos. E lembrei-me daquele tempo dos anos 70, quando surgiram os relógios digitais, em que a gente perguntava as horas (ou era perguntado) e ouvia (ou respondia): “São dezasseis e trinta e sete.” Tinha que se entrar em contas de cabeça para fazer a conversão e concluir que eram mais ou menos 25 para as 5, que era o que nos interessava saber.
Nessa altura, temi que a coisa se consagrasse e fosse o fim do relógio analógico, com os seus ponteiros que nos davam a hora exacta de uma forma muito menos fria e condicionante – e, sobretudo, muito mais belo como objecto tecnológico.
Não se confirmou o temor. Penso que deve ser dos poucos casos em que o progresso não levou a melhor sobre a tradição. Não sei bem se as razões foram puramente estéticas, ou se para além disso não suportámos ter que passar a ver só aquele minuto parado à nossa frente em vez de vermos o tempo deslizar por um quadrante como se fosse a nossa vida. Não sei. Só sei que estou muito contente com o meu relógio novo, embora geralmente não ligue muito às horas que ele dá. Para isso tenho o video, o DVD, o computador, o telemóvel, o carro, e eu sei lá que mais.